sábado, 26 de julho de 2008

MUROS...



Algumas notícias, saídas na última semana nos órgãos de comunicação social, davam conta da construção de muros nas mais diversas partes do mundo. Na realidade, dois grandes e imponentes muros de betão armado estão a ser edificados: um, na fronteira entre os Estados Unidos e o México, para evitar a entrada de mexicanos em solo americano; o outro, na fronteira entre Israel e a Palestina, para diminuir a circulação entre os dois territórios.
Para lá destes muros de cimento, outros muros estão a ser construídos. O maior destes muros talvez seja aquele que se está a levantar entre a Europa e África e que passa por uma construção política, legislativa e policial que tentará impedir o acesso, a espaço europeu, de milhões de africanos que sonham com uma oportunidade de escapar à morte e à miséria. Outro muro se está a construir dentro das nossas sociedades, que olham com receio e desconfiança para aquele que chega, quer trabalhar e, dessa forma, construir uma vida nova, da mesma forma que os portugueses o fizeram, no passado, e ainda fazem, no presente, em tantos países no mundo. Nas cidades, diariamente se edificam muros, através da disseminação de empreendimentos urbanos com acesso reservado aos respectivos residentes. Nos campos, outros muros começam a proliferar: são as estradas rurais que são destruídas; são as cercas de arame que impedem a passagem em todo o lado; são as grades e os portões que proíbem o acesso; são mesmo os muros de betão que nem o olhar deixam passar.
Neste mundo em que já todos compreendemos que só a abertura, o diálogo, a partilha e o encontro com o outro nos levarão à paz, à compreensão e respeito mútuos, cada vez há mais muros. Muros físicos, muros económicos, muros sociais, muros culturais, muros religiosos e muros mentais. Muitos, e cada vez mais altos, muros!
Lembro-me, com saudade, do espírito comunitário alentejano, onde os muros que dividiam os quintais tinham uma altura que permitia o encontro entre as pessoas: pelos muros se ofereciam e recebiam as laranjas da horta, as chouriças acabadas de curar no lume de chão, os bolos brancos da Páscoa, as filhós no Carnaval ou as palavras de amizade e verdadeira vizinhança.
Os políticos, como construtores de civilização, deveriam deitar abaixo esses muros que dividem as pessoas e os países e aprender a construir os tais muros tradicionais alentejanos: os muros que compatibilizam o direito à privacidade com o dever da boa relação e o prazer da boa vizinhança.

* texto publicado no Diário do SUL de 12 de Outubro de 2006

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